sábado, 19 de janeiro de 2019

Política e democracia para crianças (2)


Se você também anda preocupado com o nível dos debates e tensões no campo político, provavelmente está empenhado em ajudar suas crianças a desenvolver ao menos três capacidades: (1) saber lidar com ataques e ofensas nas discussões, (2) ouvir e respeitar as opiniões dos outros, ainda que discordem delas, e (3) sustentar suas ideias de modo firme e tranquilo, melhorando-as a partir do estudo, do diálogo e da ponderação. Com isso, o sujeito tem aquele equilíbrio básico pra não sofrer com bate-bocas inúteis — e pode até ajudar a melhorar a qualidade das conversas sobre a política.


Não há cursos ou academias para instalar essas capacidades nas crianças, mas há experiências do dia-a-dia que favorecem o seu desenvolvimento.

Uma delas é ficar “fazendo nada” com aquela figurinha de 2 anos, apenas acompanhando o que ela olha, o que ela toca, o que ela faz…, e falando de cada uma dessas coisas, colocando palavras simples sobre o avião que ela vê no céu, sobre a pedrinha ou o graveto que ela pegou, sobre o seu andar enquanto passeiam por uma calçada do bairro… Parece nada a ver, mas este é um dos caminhos pelos quais o adulto ajuda a criança a se reconhecer como pessoa, a saber de seu lugar e seu valor no mundo.

Com as crianças maiores, um pouco da prática do debate pode acontecer nas conversas mais elaboradas, nas discussões e até nas brigas. Aí cabe aos grandes garantir aos pequenos o espaço para a expressão de seus sentimentos, vontades e opiniões — sem aquela pressa de resolver tudo e “pacificar” o ambiente. Não pode ser juiz do conflito, apontar certos e errados, vencedor e perdedor. O adulto precisa estar ali para acolher cada um, ouvindo e até dando colo a quem fica mais raivoso ou triste no calor de uma discussão.

O que a molecada aprende nessas horas não são estratégias de argumentação ou manobras retóricas, e sim a arte de se posicionar no debate. O domínio desta arte implica justamente aquelas três capacidades, porque se trata de uma consciência sobre si. Quem se reconhece como pessoa, com seu lugar e seu valor intrínseco no mundo, pode ouvir ofensas sem se sentir destruído, pois não depende da aprovação ou da reprovação dos outros. É triste, dói ser atacado, mas a vida segue sem prejuízo às outras relações, dá pra tirar de letra.

Quem compreende seu próprio valor também não depende desta ou daquela ideia. Assim, debater não se torna um confronto de identidades, não é preciso vencer a discussão a qualquer custo (geralmente com sofismas e pós-verdades) para evitar aquela sensação de tragédia à autoimagem. Então é possível ouvir sem medo, com paciência e respeito, apontando concordâncias e discordâncias com as opiniões dos outros. A isso se dá o nome de diálogo.

No diálogo, as ideias sólidas prevalecem e se aprimoram, justamente a partir das ideias apresentadas pelos outros — principalmente pelos adversários —, enquanto as menos sólidas podem ser melhoradas ou mesmo deixadas pra trás. Esta parece ser uma relação mais produtiva e gratificante no universo do debate político. Pode soar impossível, diante do climão atual, mas acredite: quem pode crescer sob os cuidados de um adulto acolhedor tem esse bônus de lucidez e serenidade.

David Moisés e Angela Minatti
Leia também no livro:
O poder do pensamento livre ………. p.129

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