sábado, 24 de outubro de 2015

Pais e escola: um papo complexo e indispensável



O chavão diz que os pais e a escola são parceiros na educação das crianças. É verdade, e todo mundo concorda, mas quando chega a hora de dar sugestões, fazer críticas ou pedir providências aos educadores, a conversa enrosca. Às vezes fica no hãn-hãn da professora, que finge aceitar tudo; às vezes vira bate-boca (cordial ou não). “Esse conflito entre pais e escola é histórico e ainda não tem solução”, diz Tizuko Kishimoto, docente da Faculdade de Educação da USP, pesquisadora no campo da educação infantil.

Mas isso não é pra desanimar ninguém. Ao contrário: é para que mães&pais, educadores e cuidadores percebam que essa dificuldade não é particular, pessoal, que na maioria das escolinhas e escolonas, públicas e privadas, a relação é delicada e trabalhosa. Então, participar da vida escolar dos filhos requer esforço; contar com a ajuda dos pais para o desenvolvimento dos alunos requer esforço. E todo esse esforço vale muito, sem dúvida. “As escolas que conseguem oferecer educação de qualidade são aquelas que se abriram à participação dos pais”, afirma Tizuko.


Em algumas escolas públicas de São Paulo, relata a pesquisadora, o desafio era atrair os pais. Uma estratégia envolvendo kits de brincadeiras e outras atividades lúdicas fez sucesso, e os adultos enfim adentraram os portões. Foi uma alegre surpresa ver como trabalhadores de baixa renda se engajaram nas atividades dedicadas à educação dos filhos. Mas aí os conflitos começaram a surgir, já que os genitores “perderam o medo de dizer o que pensam, do que discordam”. Neste ponto, o cenário fica então parecido com o padrão, e as professoras começam a evitar o contato com as famílias.

“É dificil mudar os hábitos de alguém que já trabalha de um jeito há muitos anos, é um problemão que se adiciona à rotina da escola”, explica Tizuko. Um novo peso na já pesada rotina docente, onde cada aluno traz uma família própria e particular na mochila.


Mesmo entre as escolas caras, habituadas a lidar com uma clientela cheia de exigências e opiniões, há mecanismos sutis para manter os portões virtualmente fechados. Tem aquelas que só fazem média: capricham no café, sucos & quitutes, promovem reuniões com apresentações espetaculares e fingem que ouvem os pais.

Tem pai de todo jeito, e nem sempre suas contribuições são razoáveis. É uma canseira lidar com a mãe que se acha pedagoga por vocação e compete com a professora, o pai que quer um prezinho mais conectado com a realidade do mercado profissional selvagem em que ele atua, a família fervorosa que quer ver seus valores incluídos no currículo, a mamãezinha do maternal que quer ser adotada pela professora da filha…


Mas existem recursos para coordenar essa participação, para que ela se torne produtiva e reverta em benefícios às crianças. É o que mostram escolas que reestruturaram suas atividades, abriram mão de práticas nem sempre úteis, integraram os pais de forma adequada e, hoje, comemoram a melhoria da qualidade do desenvolvimento de seus pequenos alunos.

Nessa relação tensa, os educadores são os únicos que podem fazer algo para melhorá-la. Talvez a primeira providência seja deixar de ver as manifestações dos adultos como uma intercorrência, um ruído ou chatice de quem vive em outra realidade. A chave pode ser aceitar essa difícil tarefa com os pais como parte necessária da rotina, importante para estruturar relações que precisam se estender até a casa da criança, integrando experiências. Se essa parceria é pra valer, o caminho deve ser por aí.


David Moisés e Angela Minatti