sábado, 13 de dezembro de 2014

Cuidado com a TV



Os pais brasileiros parecem conscientes do seu papel em relação ao que crianças e adolescentes devem ou não ver na TV:
  • 100% afirmam que eles devem ser os responsáveis por esse controle de conteúdo.
Também se mostram atentos sobre o tipo de conteúdo que pode ser nocivo aos filhos:
  • 91% se dizem muito preocupados (67%) ou preocupados (24%) com cenas de mortes violentas;
  • 92% se dizem muito preocupados (67%) ou preocupados (25%) com cenas de agressão física e violência;
  • 95% se dizem muito preocupados (79%) ou preocupados (16%) em relação a cenas de tortura, suicídio ou estupro.
Mas revelam que só a metade deles exerce efetivamente esse controle:
  • 54% respeitam sempre a classificação indicativa dos programas;
  • 34% das crianças e adolescentes respeitam a classificação indicativa dos programas quando os responsáveis estão presentes.
Esses dados estão na pesquisa que a Unesco Brasil e o Ministério da Justiça apresentaram em 11/12/2014, depois de ouvir em todo o país 3.023 adultos sobre "o comportamento das crianças/adolescentes e dos pais/responsáveis em relação ao uso das mídias".


Os números destacados acima são positivos quanto à consciência sobre essas questões, mas preocupantes quanto ao cuidado efetivo que os adultos estão conseguindo oferecer à molecada. Revelam, portanto, um campo fértil para necessárias e desejadas políticas de orientação às famílias sobre como proteger a prole de conteúdos nocivos.

O estudo, em si, é um passo nessa direção. A Unesco vem trabalhando no que se chama educação para a mídia (ou media literacy), um conceito amplo que inclui o desenvolvimento de competências para avaliar conteúdos e saber como usá-los - ou descartá-los.

Esse termo surgiu há alguns anos, associado a pesquisas sobre o impacto da TV e dos games sobre as crianças. A Academia Americana de Pediatria chegou a fazer recomendação explícita, em comunicado, sobre a necessidade da educação para a mídia.

O estudo da Unesco Brasil e do Ministério é um passo também para o fortalecimento do sistema de classificação indicativa, sempre ameaçado pelos interesses das grandes emissoras comerciais. Há quem tente "simplificar" o sistema, sugerindo reduzir o número de faixas etárias - como se acreditassem que um garoto de 10 anos recebe o mesmo impacto que um de 14.

É importante manter as faixas etárias e fortalecer o enquadramento do conteúdo. Você pode já ter vivido aquela situação de emergência quando o filme para "12 anos" mostra, de repente, uma cena de violência sensual/sexual que abala inclusive os adultos.

Cabe às emissoras investir (sim, é preciso gastar dinheiro nisso) numa classificação sempre mais apropriada,  assim como cabe aos adultos em casa manter a atenção e o controle - não apenas o remoto.

David Moisés









segunda-feira, 20 de outubro de 2014

A janela de oportunidades no cérebro dos bebês



É legal ver como muitas pessoas estão percebendo a importância estratégica de cuidar bem das crianças, desde pequenas, para que cresçam com ótimas capacidades e oportunidades. Você deve estar vendo por aí se falar mais em primeira infância, zero a três, zero a seis, estímulos precoces, janela de oportunidades para o desenvolvimento da criança etc.
Seria bom lembrar umas coisas.

O período inicial da vida dos pequenos tem muito mais a ver com afeto e estrutura emocional do que com inteligência. Quer dizer, qualquer pai pode desejar que sua prole tenha um QI exorbitante e uma carreira meteórica, com uma rápida escala em Harvard como gênio-convidado, mas não vale tentar turbinar o cérebro do nenê.

Esse velho papo de aproveitar a criança em desenvolvimento para aplicar adubos cognitivos volta sempre com alguma técnica recém-lançada ou com algum mote publicitário bacana. À medida que novos estudos mostram como o cérebro se forja na infância, aumenta a tentação de aproveitar a massa fresca para implantar algum chip que multiplique o desempenho intelectual.

a construção do cérebro


Bate um certo ai-meu-deus quando a gente lê que “80% das células cerebrais que uma pessoa terá para sempre são produzidas nos dois primeiros anos de vida”, e chega-se facilmente ao desespero na parte em que o cientista diz que “se o processo de construção dessas células e das conexões entre elas der errado, os déficits serão permanentes”.

Esses textos costumam ser acompanhados daquelas imagens chocantes mostrando o cérebro de uma criança de 3 anos severamente negligenciada, que parece desidratado, contraído, com reentrâncias e áreas “vazias”, menor do que um cérebro normal de criança suficientemente cuidada.

cuidado afetivo suficiente


Um dos cientistas que falam e escrevem essas coisas é Allan Schore, da Universidade da Califórnia – Los Angeles (UCLA). Mas o interessante, no caso dele, é o resultado de seus estudos para determinar o que seria uma criança suficientemente cuidada. É essencialmente a presença afetiva da mãe ou de um adulto cuidador que faz a diferença, conclui o pesquisador.
O desenvolvimento das células do cérebro e de seus circuitos “é uma consequência da interação da criança com seu principal cuidador, depende literalmente de uma interação positiva entre mãe e filho”, afirma Schore.


Ele é identificado geralmente com o attachment parenting (criação ou parentalidade com apego, como alguns traduzem), uma espécie de linha ou escola de pensamento que, como tal, sofre lá suas críticas e provoca suas controvérsias. Os estudos de Schore, de qualquer forma, fazem grande contribuição, assim como sua experiência na área.

Dê uma olhada nesse trecho de sua entrevista a um jornal uruguaio:
P - Como a mãe pode saber que está fazendo as coisas direito?
Allan Schore – É uma aprendizagem que não tem tanto a ver com ‘fazer’, e sim com ‘ser’. Como transmitir empatia? Sendo cuidadosa e atenta, pondo o bebê em primeiro lugar, sendo aberta, genuína, estando disponível emocionalmente. Também ajuda se há uma relação forte entre a mãe e o pai. A chave é essa satisfatória forma de relacionamento. O foco não é racional, mas sim emocional.
Se você leu
  • Pós-graduação para crianças (p. 246),
  • Ele não é um geniozinho?... (p.212) ou
  • Salvando bons alunos (p.238)
vai lembrar que a estrutura emocional é base para a construção das capacidades intelectuais – nunca o contrário. Agora estamos perto de concluir que as emoções são base para a construção do cérebro em si.

a matéria-prima


O que os novos estudos estão mostrando não são simples janelas de oportunidades na cabecinha das crianças, mas um outro tipo de fundação, que passa por processos físicos, psíquicos e emocionais e que se estrutura na relação com a mãe e seu cuidado afetivo, matéria-prima inigualável.

Portanto, é bom não trocá-la por estímulos, softwares pedagógicos ou chips que não tenham onde ser plugados.

David Moisés e Angela Minatti


segunda-feira, 9 de junho de 2014

Palmada e a lei





A Lei da Palmada é uma pavonice de políticos e celebridades, é conceitualmente vaga, propõe-se inutilmente a regular o que já está regulado pelo Código Penal, cria algumas incertezas e deve acabar virando algo juridicamente inócuo. São vários os defeitos apontados por especialistas de diversas constelações do conhecimento desde que a ideia começou a tramitar na Câmara dos Deputados, com o projeto de lei 2654/2003, até a sua aprovação pelo Senado em 4/6/14, na forma do PLC 58/2014, encaminhado para sanção presidencial. Um aspecto parece ser positivo: ela é uma lei.

Campanhas contra chineladas e palmadas existiram e existem, mas não têm a força suficiente para provocar reflexão maior numa sociedade acostumada aos castigos físicos como recurso educativo. O Brasil tem uma longa tradição de manuais de puericultura que ainda no século 21 prescreviam aos genitores infligir dor a seus petizes como forma de discipliná-los. É claro que hoje não pensam assim os que admitem bater no bumbum como última das soluções pedagógicas ou que advogam o tapinha leve, mas é forte o atavismo ou a conveniência que mantêm o exercício renitente desse poder. Em 2010, eram 54% os brasileiros contrários a qualquer medida legal para coibir essas práticas.

Crianças mimadas e despóticas, produzidas em escala crescente, servem de munição para quem diz que está faltando palmada. Faltam limites, que nada têm a ver com palmadas (abordamos isso nas pgs. 43 a 60). Dar limites dá mais trabalho, exige discernimento, disposição, firmeza e respeito pela criança. Isso é o que funciona, mas requer um preparo que os pais dificilmente recebem em suas famílias e que não encontram nos guias de autoajuda. Para piorar, na era ilusionista do consumidor-rei, do conforto permanente e da satisfação imediata com 36 meses para pagar, é difícil optar por algo que exija mais empenho em vez de clicar na tecla Paft “quando a paciência acaba”. Depois, curte-se no Face aquele post tipo “obrigado mamãe pelas surras que fizeram de mim um homem digno” e sossega-se a consciência.

Argumentos e piadas

Assim como posts, não faltam bons argumentos contra essa lei incômoda. Preocupa, por exemplo, o fato de estarmos com ela recorrendo ao direito penal para forçar os pais a serem melhores pais. Cria-se assim mais uma grande demanda ao Judiciário, já assoberbado e moroso. Além disso, nosso aparato judicial tenderia historicamente a ser muito intrometido e abusivo quando trata dos domínios domésticos. Tem ainda o argumento de que o Brasil cria leis demais com educação de menos. E tem também as piadas - não intencionais, em alguns casos -, como a dos pais protestando por não poderem mais “educar” seus filhos, crianças abusando da proteção legal para extorquir mimos e presentes etc.

A Lei da Palmada não deve mudar nada para quem se acha no direito de dar uns tapas esporadicamente, e ninguém precisa se preocupar com vizinhos pescoçudos inventando coisas para denunciar ao Conselho Tutelar ou à polícia. A imprecisão do texto torna difícil sua aplicação. Mas essa imprecisão pode ser positiva justamente por fazer a sociedade dedicar um tempo a pensar e a tentar definir o que seria sofrimento físico, humilhação e ridicularização impostos por um adulto a uma criança ou adolescente, por um pai a um filho. Aliás, esta reflexão induzida, e até mesmo forçada, é uma das razões pelas quais existem as leis. Neste caso, a lei transmite a decisão fundamental da sociedade (afinal, bem ou mal, nós elegemos aqueles caras no Congresso) de dizer não aos castigos físicos e psicológicos.

Filhos testam e irritam seus pais porque precisam

Essa interdição de um caminho costumeiro nos leva a sair do piloto automático e a pensar em rotas alternativas, a traçar novos circuitos simbólicos e a ser gradativamente mais capazes de empreender outras atitudes, que não precisam nem rumar na direção das palmadas. Filhos testam e irritam seus pais porque precisam: enquanto fazem isso, conseguem construir algumas das capacidades psíquicas e emocionais necessárias à vida neste mundo. Pode-se atuar nesse processo dando o suporte adequado, sem tapinhas frios e pretensamente pedagógicos (linguagem estranha essa...), sem que a irritação natural se agrave desnecessariamente e predomine a ponto de levar a um tabefe - que significa a perda de controle e a derrota completa.

Há um caminho razoável, com diversas possibilidades de cuidado que podem ser conhecidas e exploradas quando se bloqueia o acesso fácil e viciado à solução da palmada. A lei pode não pegar, ou pode pegar e provocar efeitos colaterais danosos - devemos estar prontos a corrigir. Enquanto isso, podemos aproveitar para dar mais um passinho à frente no nosso vacilante processo civilizatório.

David Moisés e Angela Minatti

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Terceira edição já chegou!






Acaba de sair da gráfica a terceira edição de Prepare as crianças para o mundo.

Quentinha :-)

Para um livro que não se vende em livrarias, cada nova edição tem um sabor especial de realização, vem com ainda mais valor. Mostra que a obra cumpre seu papel de atender às expectativas e necessidades do leitor, e que ele mesmo cuida de divulgá-la em sua rede.

Além do respeito e do apoio do público, Prepare as crianças para o mundo vem trazendo o respaldo crescente de pessoas reconhecidas pela competência e pela lucidez.

Três dessas personalidades tiveram resumos de seus comentários adicionados à contracapa desta terceira edição: o escritor e colunista Zuenir Ventura, a educadora Guiomar Namo de Mello, presidente do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, e o psicanalista, escritor e colunista Contardo Calligaris.

Para dar forma e fazer este livro chegar às mãos do leitor, muitas pessoas trabalharam duro. Portanto, aqui vai nosso agradecimento a:

Luciana Pereira Alencar (Lulu Alencar)
Kleber Campelo
Maria do Carmo Oliveira
Paulo Fernando Rojas Moreno
Marcos Jora
Breno Tumani
Aldo Mich
Valdimi
Cleverson
Elaine
Joilda Magna
Maria José
Gleice Lima
Thaina Ribeiro
Jessica Marcela
Carina Serrano
Rafael Vitzel
Leonardo Stock
Victor de Almeida
Carolina Sousa

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Digite 100 para proteger crianças




É possível fazer algo simples para ajudar crianças que estão nas ruas sendo exploradas e sofrendo abusos. Em vez de engolir a indignação e desanimar com o tamanho do problema, você pode digitar no seu celular o número 100 e relatar situações que tenha presenciado, como a dos meninos na esquina pedindo trocados ou a das meninas abordadas por adultos na gringolândia da sua cidade.

É um alento para pais que se importam com quem não tem pais.

Funciona assim: você liga para o Disque 100, uma gravação atende, toca a musiquinha e um operador entra em seguida para ouvir seu relato, perguntando detalhes e registrando tudo. Não precisa se identificar, se não quiser. A denúncia vai ser encaminhada à autoridade encarregada daquele tipo de problema, naquele Estado e naquele município. O Disque 100 promete informar em três dias as providências tomadas em relação à sua denúncia.

É claro que a linha pode estar ocupada e a musiquinha de espera pode ser longa, mas isso custa pouco se comparado a não fazer nada. É claro, também, que não vai pousar nenhum helicóptero da polícia para salvar as crianças ali na sua frente. O mais provável é que as autoridades agora não consigam ir além do manjado aumento-do-patrulhamento, na semana seguinte, mas já é alguma coisa.

No médio e no longo prazos, um número crescente de ligações pode pressionar o Poder Público a tomar medidas com maior inteligência e eficácia. No mínimo, essa é uma forma de a sociedade dizer que queremos cuidar das nossas crianças.

Há muitas delas literalmente abandonadas, o que quase sempre significa serem subjugadas por adultos. O lado mais tétrico desse problema são o tráfico de crianças, o abuso sexual e a exploração sexual. Para gente minimamente normal, pensar nisso é tão repulsivo que damos um jeito de mudar de assunto. Mas não precisamos mergulhar nessas trevas, basta observar o que salta aos olhos.

Situações a serem relatadas são, por exemplo, a da garota junto à janela do carro conversando com o motorista e entrando no veículo, ou a daqueles marmanjos levando papos com meninos e meninas em praças, calçadões e bares. É fácil ver nas ruas crianças em situações em que a disponibilidade é evidente.

“Recentemente vi num bar na Lapa (Rio) uma mesa com quatro estrangeiros e quatro meninas brasileiras. Ninguém vai com criança para um bar, só se for em família”, explica Ana Cristina Silva, da Rede Criança, ONG que combate a violência contra crianças e adolescentes. “Em qualquer lugar a violação de direitos acontece.”

Ter dúvida sobre uma determinada situação não é problema. Se aqueles homens e aquelas meninas à mesa do bar são parentes ou não, isso é assunto para as autoridades. As denúncias ao Disque 100 são checadas, e o cidadão que liga pode deixar claro que não tem certeza de se tratar de uma violação. “Diga que você tem uma suspeita”, orienta Ana Cristina.

Ninguém precisa correr riscos, tipo sacar o celular diante da cena, com cara de estou-te-denunciando ou se disfarçando de agente secreto. Escolha um momento seguro, ligue e relate tudo o que viu, com todos os detalhes que lembrar - principalmente sobre a localização.

Se a situação for considerada emergencial, o pessoal do Disque 100 aciona diretamente a polícia. Pela experiência, Ana Cristina calcula que leve “umas duas horas” para que cheguem ao local. É tempo mais que suficiente para você decidir se quer ficar para ver a ação policial.

Estrangeiros que vêm para a Copa também terão a chance de mostrar que não praticam nem apoiam o assédio às crianças brasileiras. Como são frequentadores naturais das gringolândias, eles têm grande probabilidade de presenciar situações de violação, e podem também denunciar. Nos aeroportos, ao passar pela Imigração, deverão receber material com instruções sobre o Disque 100.

A Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, que coordena o Disque 100, reuniu no final de março 26 representações diplomáticas em Brasília para cobrar seu envolvimento no esforço de proteção às crianças. “Todos foram muito receptivos e muitas embaixadas se dispuseram a traduzir material para turistas de seus países, alertando-os que serão responsabilizados em caso de violação e orientando-os a fazer denúncias”, conta Marcelo Nascimento, representante da Secretaria.

David Moisés

sábado, 12 de abril de 2014

Figurinhas: você pode trocar muitas com seu filho




Saiu o álbum de figurinhas da Copa e você já sabe disso, claro. Quem tem filhos integra a população que vive sazonalmente a inundação de pedidos para ir à banca da esquina. Vale a pena viver essa experiência com a molecada. São fortes emoções, diversos conflitos e sentimentos que constituem matéria-prima para viver a vida. Se os pequenos tiverem o suporte dos adultos, melhor ainda.

Para isso, é legal lembrar algumas coisas importantes para eles que estão em jogo nessa caçada à cobiçada figurinha brilhante.

A capacidade de esperar para ganhar, para saciar uma vontade, é quase sempre a primeira a ser desafiada. Portanto, é a primeira grande oportunidade para aprender a dar conta dessa coisa angustiante que a vida impõe a todos. De olho nessa necessidade dos pequenos, os pais podem decidir como e quando comprar um álbum, quando e quantos pacotes de figurinhas serão comprados de cada vez.

Esperar para receber o álbum, esperar para comprar as próximas figurinha, esperar para chegar em casa e colar nas páginas com capricho, tudo isso permite experimentar um estado (mais que uma simples ideia) de que algo bom está em curso e vai se estender. Os adultos podem ajudar as crianças a suportar aquela sensação aflitiva da espera. Podem dar apoio e colo, dizer que compreendem e também sentem aquilo nessas situações. E podem se esforçar para não sucumbir à agonia dos filhos, não comprando a banca inteira nem tachando-os de “ansiosos” quando estão apenas trabalhando com seus sentimentos mais crus, encontrando lugares internos para eles e aprendendo a viver o que é bom.

Lidar com sensações e sentimentos contraditórios é outra experiência valiosa para as crianças. Uma montanha-russa de conquistas, frustrações, vitórias, derrotas, inveja, solidariedade etc é percorrida no convívio com os irmãos, primos e colegas que se comparam, competem, se ajudam, trocam, trapaceiam, perdem de bobeira, jogam bafo… Experimentar sensações opostas ao mesmo tempo é, em si, muito enriquecedor. São momentos em que a compreensão se aprofunda. Para o molecada, é também uma chance de perceber a mudança de estados de humor entre os colegas, que ora têm mais, ora têm menos figurinhas.

Dá para os pequenos compartilharem essas impressões e sensações, dá para conhecerem maneiras diferentes que cada um tem de batalhar, suportar as esperas e frustrações, curtir. É um cenário interessante em que eles precisam se manter por algum tempo num clima de algo-completo e algo-faltando. E podem ter o prazer daquela figurinha suada, conquistada, com história, podem se confrontar com as neuras das outras crianças, com a atitude daqueles que dão aos colegas as figurinhas que sobram, com a vontade de não dar as suas a ninguém, com a superioridade do primo no bafo, com a falta de grana do amigo (ou sua) para completar o álbum...

Experimentar no mundo real esse choque entre vontades e restrições ajuda a perceber que as circunstâncias da própria vida podem dar um grande barato, que coisas legais também acontecem à revelia, que o controle não é a chave do negócio. Tudo isso é intenso, e o apoio dos adultos faz toda a diferença para determinar se o álbum estará completo tão logo o último lote de figurinhas chegue às bancas, ou se a aventura vai rolar de modo mais cadenciado. O importante é perceber como as crianças estão conseguindo processar as sensações, pensamentos e sentimentos agitados nessa maratona.

Para os pais, essa aventura é uma oportunidade de compartilhar com os filhos uma série de situações, tão diversas quanto enriquecedoras para grandes e pequenos. É claro que dá mais trabalho que liberar uma verba e ver o(s) álbum(ns) completo(s) algumas semanas depois. Mas olhinhos brilhantes valem mais que todas as figurinhas mais raras, certo?

Angela Minatti e David Moisés


Figurinhas na escola
Conte como a escola do seu filho está lidando com o assunto.
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